Uma
aventura entre linhas
A animação dentro do comboio era descomunal.
Os rapazes jogavam à “sardinha” enquanto as gémeas conversavam com Duarte, um menino sapientíssimo
e com um belo e jovem semblante. Apenas havia o azar deterem de deixar os cães
em casa, pois a CP não tolerava animais de estimação a bordo.
- Vais para a cidade mais alta de
Portugal? – interrogou Luísa.
- Sim, quis aproveitar os primeiros
dias de férias da Páscoa junto dos meus avós e agora estou de regresso a casa,
na Guarda.
- Nós também. Estamos a pensar em
acampar por aí! - declarou Teresa.
Quando uma voz soou pelas carruagens
a informar que a próxima paragem era a Estação, datal cidade da Beira Alta, nem
ligaram. Mas as horas de trabalho do maquinista chegavam ao fim... Este dirigiu-se
a eles e ordenou, como se os quisesse ver longe o mais rapidamente possível:
- Caros jovens, imagino que este
seja o vosso destino. Saiam!
A mando do homem, abandonaram o meio
de transporte e enfiaram-se no quiosque. Lá, uma multidão desfolhava os jornais
que estavam à venda.
-
Vejo que estão com frio... venham para minha casa! Os meus pais teriam todo o
gosto em receber-vos. Mas antes, vou comprar um molho de revistas para o meu
pai! - disse o novato do grupo.
Todos lhe agradeceram e, como uma
flecha, Duarte fez o que tinha a fazer. Chamou um táxi e daí a um bocado, já
estavam à porta de uma bela vivenda, caiada de branco. Quem a veio abrir foi um
casal.
-
Olá, pais! Trouxe comigo uns amigos que conheci no comboio. Vieram de Lisboa e
gostaria de os acolher na nossa casa. Há camas suficientes, comida não falta e atividades para
realizarmos também não. Posso dar-lhes guarida?
-
Com todo o gosto. – respondeu prontamente o pai do Duarte. – Entrem que a
Guarda é fria e ainda congelam aí fora!
Foram
acolhidos com muita bondade, jantaram com fartura vários pratos típicos da região,
ainda trocaram palavras sobre os planos do dia seguinte e foram-se deitar.
Mal
o sol raiou, Pedro levantou-se sorrateiramente, tirou o telemóvel do saco que
tinha trazido e colocou no motor de busca, Google
Maps. Abriu o primeiro site que surgiu, com o objetivo de conseguir
informações sobre o trilho “Ente Linhas”: tinha uma extensão de oito quilómetros
e durava cerca de três horas a percorrê-lo. Acordou os companheiros e até mesmo
o anfitrião mais novo da casa.
Tomaram
o pequeno almoço, servido pela mãe de Duarte, equiparam-se a rigor e lá foram
eles realizar o belo trilho!
-
Iremos passar por estradas secundárias e caminhos rurais, quase sempre entre as
linhas do comboio...
-
Calculo que seja essa a razão para o nome do itinerário... – rematou o João.
-
Nem mais. É circular e acaba aqui no POLIS, que também é o local da nossa
partida.
Pedro, com um ar de nerd, acrescentou às palavras do
guardense a sua pesquisa. Todos ficaram um pouco desiludidos pela demora imensa
do passeio, exceto Duarte, que conhecia aquilo de trás para a frente.
Passados
uns minutos, encontraram umas carruagens cor-de-rosa que não estavam sobre o
caminho férreo. Tinham um ar deserto, mas ainda não se podiam considerar
abandonadas, velhas ou coisa do género. Como a curiosidade de dar uma
espreitadela era imensa, decidiram entrar em fila indiana no primeiro acesso que
vislumbraram. À primeira vista, só havia o expectável: assentos. Mas quando saltaram
para a outra carruagem, deram de caras com um número incontável de
computadores. Determinados dispositivos estavam ligados, outros quebrados...
Pedro chegou-se a um aparelho que estava ativo.
-
Dados pessoais... estão a roubar informações privadas... Enquanto realizo esta
minha investigação, pormenorizadamente, vejam o que revelamos
restantes portáteis para poder tirar ilações.
-
Aqui há uma apresentação em PowerPoint sobre
a localização de um casal que habita na Guarda, ou seja, onde nos situamos e também
um estratagema qualquer! – respondeu prontamente o Chico.
As
gémeas analisaram outro computador e leram em voz alta alguns nomes dos artigos
espalhados pelo ambiente de trabalho: “Ouro - Maria Jesus – Guarda; Diamantes -Rita
Paiva - Guarda; Pinturas valiosas – José Alberto – Guarda...”.
Não
foi necessário o Duarte e o João terem trabalho, pois as conclusões de Pedro já
estavam quase todas tiradas:
-
Existe uma rede criminosa que obtém as localizações exatas de pessoas
egitanienses e estrutura planos para assaltarem as suas habitações. Este deve
ser o seu esconderijo! Como consegui ver que o penúltimo acesso daquele
computador foi ontem à noite, a quadrilha é atual. Mas, para ter a certeza
total, vou dar uma olhada rápida às definições dos outros aparelhos.
Mal
Pedro proferiu estas palavras, o telemóvel do Duarte chamou. Era a sua mãe,
para os mandar vir embora, mas inventou uma desculpa qualquer para apenas ir ele.
-
Não se demorem muito! O caminho para casa é apenas o inverso ao que fizemos.
Amanhã fazemos o trilho, porque hoje, nem um décimo percorremos. Eu digo aos
meus pais que gostámos muito e que queremos voltar a repetir... Uma mentira
deste tamanho não tem problema. Adeus!
Daí
a bocado, os perfazimentos extinguiram-se de vez e, quando se dirigiam para a
residência do amigo... Pum... um tiro soou mesmo atrás deles. Um dos homens do grupo,
com cara de malfeitor, tentou apanhá-los, mas desataram a correr.
-
Se fogem, acerto-vos com balas. Aqui, agora!
Cheios
de medo, obedeceram automaticamente, como se os corpos fossem telecomandados. O
mesmo senhor que os ameaçou, enfiou-lhes mordaças na boca, atou-lhes os pés e
as mãos e colocou-os exatamente por cima das linhas férreas.
-
Desfrutem! – gozou agora o chefe deles, que não era nada mais nada menos do que
o maquinista.
Os
vilões entraram nas carruagens, com ar de vingança e desapareceram entre os
bancos.
Finalmente
a sós, através do olhar, transmitiram uns aos outros a sensação de não saberem como
se livrariam daquela situação. Até que tocou o telemóvel do João...O rapaz
guardense estava preocupado com eles e só percebeu que estavam mesmo em apuros
quando recebeu uma mensagem escrita pelas mãos enlaçadas de Luísa. Em resposta, o
Duarte confirmou as conclusões de Pedro, informando-os de mais sete assaltos na
noite anterior que formaram uma notícia para a televisão. Avisou-os que já
tinha ligado para as autoridades e que, então, finalmente a ajuda ia a caminho.
De
seguida, já se ouviam as sirenes bem perto da “toca dos lobos”, cercando-a com
carros e carrinhas. Mal os criminosos saíram da carruagem, a pensar que ainda
teriam hipótese de escapar, tiveram uma surpresa desagradável: ficaram, cada
um, debaixo de respetivo polícia; também lhes foram colocadas algemas e foram levados
à esquadra para prestarem declarações.
Duarte
e os pais soltaram os seus “hóspedes”.
-
Quase que eram as linhas que vos davam cabo da vida! Amanhã, vimos todos
realizar o trilho! Vai ser altamente! Vamos todos celebrar a vossa astúcia e
coragem! No futuro vocês vão ser uns autênticos investigadores. - festejou a
mãe do Duarte.
Riram
a bom rir e foram para casa deles com a sensação de dever cumprido!
Gonçalo Valgôde, 6ºC
Agrupamento de Escolas da Sé, Guarda
Escola Básica Carolina Beatriz Ângelo