França, 09
de Abril de 1918
Minha doce
Maria,
Antes de mais, queria saber se está tudo bem contigo e com o nosso
filhinho António. Desculpa não ter dado notícias mais cedo, mas como tu deves
imaginar, isto aqui está um caos. Mas não te preocupes, que eu estou bem.
Este mês que passei longe de casa foi muito difícil,
primeiro por causa das saudades que tenho de vós. Depois porque estes últimos
dias têm sido um verdadeiro inferno, muitos dos meus colegas perderam a vida e
o meu melhor amigo e companheiro de guerra vai ter que ser amputado.
Para a semana vamos ser transferidos para um local chamado
La Lys. Dizem que está lá um grande exército alemão e os aliados precisam da
nossa ajuda. Prevejo tempos muito complicados!
Não imaginas o quão difícil é a vida nas trincheiras. Está
tudo lamacento, há pouca comida e a que há mal chega para todos e está muito
desidratada. Também há piolhos, pulgas e ratos que são muito piores que os
inimigos, pois trazem muitas doenças e quando estamos a combater só temos vontade
de nos coçar.
O inimigo tem atacado com armas novas. Uma delas, é um gás
tão forte, que a maioria cai logo ao chão e até o próprio inimigo tem de usar
uma máscara. A outra é a metralhadora, que dispara milhares de balas por minuto
e por isso a trincheira fica cheia de homens mortos aos nossos pés.
Como se não bastasse isto tudo, o frio é tanto que neva há
já vários dias. Apanhei uma terrível constipação e não paro de tossir. As
noites são tremendas, não consigo dormir por causa dos disparos, passo a maior
parte do tempo sobressaltado. Os minutos parecem dias!
Pensar em ti e no António, é o que me tem dado forças para
continuar a lutar! Peço-te que rezes por mim. Eu também tenho pedido a Deus que
a guerra acabe o quanto antes, mas parece-me que o fim não está próximo.
Prometo que volto são e salvo para vos abraçar. Não me
esqueço que o nosso querido filho faz 3 anos daqui por duas semanas. Por favor
dá-lhe os meus parabéns, porque eu sei que não vou poder estar presente.
Fala-lhe de mim que é para ele não se esquecer que o adoro.
Do teu amado Rafael
9ºA Rafael
Fernandes nº 17